Os muros da mídia
Quem vive de conteúdo jornalístico precisa de marcas que sejam não só
respeitadas, mas também desejadas
A News Media Alliance (NMA), entidade que representa os jornais impressos e online nos Estados Unidos, encaminhou ao Congresso norte-americano, este mês, pedido para que se abra uma exceção às leis antitruste do país. O objetivo é conseguir um aval federal para que a associação negocie coletivamente com Google e Facebook questões relativas a alguns temas caros ao setor, como a proteção à propriedade intelectual, o suporte a modelos de inscrição e o compartilhamento da receita publicitária das plataformas.
Os gigantes da internet afirmam estar abertos às conversas e colocam na
mesa ferramentas e serviços para que os jornais ampliem as fontes de
faturamento dentro de suas propriedades digitais. O Google informa um repasse
de US$ 16 bilhões, ao todo, a publishers que utilizaram suas mecânicas de
monetização em 2016. Já o Facebook estaria desenvolvendo um modelo de paywall
para os veículos adeptos de seu formato Instant Articles, que seria colocado
à disposição do mercado no último trimestre do ano.
O pleito para a negociação com as plataformas é uma das frentes abertas
pela mídia tradicional na busca por receitas que tornem a produção de notícias
outra vez um negócio sustentável e lucrativo para acionistas e investidores. O
setor já percebeu que esse caminho somente será possível se colocar seu
propósito original no centro de suas ações. O advento das fake news tem
diversos efeitos diretos e colaterais nocivos à sociedade, mas é fato que
ajudou a lembrar o público e à própria imprensa para que existem os jornais e
as revistas: democratizar o acesso à informação, revelando movimentações que do
contrário ficariam restritas aos bastidores, com uma checagem imparcial e
precisa dos fatos e diversidade de opinião na análise das consequências.
“As pessoas vão voltar às marcas confiáveis. Tudo o
que está acontecendo no mundo ajuda gente como nós, ajuda o The Wall Street
Journal, ajuda o Financial Times, a Time Magazine, todas essas marcas de mídia
confiáveis com as quais as pessoas contam para acessar notícias, informações e
insights importantes”, afirmou o presidente do The Economist Group, Paul Rossi,
à repórter Roseani Rocha.
Em poucas palavras: é preciso ser uma fonte
confiável de informação, um serviço fundamental e valoroso, que não pode ser
oferecido de graça — algo que pode soar óbvio hoje em dia, mas ignorado por
mui- tos anos pelo mercado, salvo raras exceções, como o The Wall Street
Journal, que há duas décadas já cobrava pelo acesso ao seu conteúdo. No Brasil,
a Folha de S.Paulo completou cinco anos de seu modelo de paywall. Destacando
uma trajetória ascendente da audiência dentro da nova dinâmica, o diretor
executivo de circulação e marketing do jornal, Murilo Bussab, diz que é um
marco que mudou a forma de pensar a indústria, como declarou ao editor-assistente
Sérgio Damasceno. Mas o próprio Bussab alerta: “Só ó paywall não é suficiente”.
A fórmula para aumentar o fluxo para o
caixa das empresas jornalísticas passa por assumir que a imprensa precisa de
marcas que sejam respeitadas, sim, mas também desejadas. É preciso ampliar os
pontos de relacionamento com os leitores, em uma lógica muito mais B2C do que
sugere o modelo puramente baseado em vendas de anúncios. O Financial Times
promoveu em Londres eventos para discussão de temas atuais, nos quais seus
assinantes tinham acesso direto aos jornalistas, com uma cobrança de ingressos
entre US$ 20 e U$S 40. O The New York Times, que durante as eleições nos EUA no
ano passado pro- moveu encontros similares aos do Financial Times, aposta em
sua porção lifestyle ao manter uma loja online na qual comercializa camisetas,
bonés e até guarda-chuvas com o logo do jornal.
São iniciativas que certamente não geram os milhões necessários para
sustentar suas estruturas. Mas servem como símbolo dos novos tempos, em que é fundamental
aumentar o engajamento e a exposição junto ao público e abrir outras linhas de
receitas. Tempos nos quais marcas fortes seguem reconhecidas pelo público, mas
em que o dinheiro já não bate mais à porta.
Fonte: Meio&Mensagem
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