Jornais,
boas notícias
Você chamaria de louca uma
pessoa que, em fevereiro de 2009, lhe sugerisse investir em jornal. Claro, o
mundo estava no auge da crise financeira global iniciada em setembro do ano
anterior. Além disso, e principalmente, a internet já se incorporara
definitivamente à paisagem e o Facebook transformava-se num gigante,
aproximando-se do seu primeiro bilhão de usuários. Os anunciantes estavam
debandando dos jornais e migrando para as plataformas digitais. Os leitores
passaram a ter uma urgência até pouco tempo antes desconhecida e começaram a
achar que as informações que colhiam de graça no Face e na internet lhes
bastariam. Diante disso, obviamente você não colocaria um centavo do seu
dinheiro em jornal.
O valor dos grandes jornais
havia chegado ao fundo do poço. Todos encolheram com sucessivos cortes de
pessoal, outros foram vendidos a preços ultrajantes, e muitos desapareceram. No
dia 1º de fevereiro de 2009, cada ação do “The New York Times” (NYT), o maior
jornal do mundo, era cotada a US$ 4,13 na Bolsa de Nova York, resultado mais
baixo de um mergulho iniciado em 2004, quando a tormenta por que passaria a
mídia impressa começava a produzir os seus primeiros relâmpagos. A onda era
sair do papel e correr para a internet, fazer blogs, construir perfis digitais,
buscar relevância fora do velho mundo analógico.
Com o tempo, fazendo inúmeros
ajustes no negócio e nas redações, dominando a tecnologia digital para oferecer
notícias e análises em tempo real, e como sempre dispondo de informação
confiável, os grandes jornais foram se reconstruindo, se reerguendo,
estabilizando suas contas e aos poucos reconquistando valor. Em 11 anos, as
ações do “New York Times” subiram 924%, e cada uma valia ontem US$ 38,78. Se
você tivesse ouvido aquele louco em 2009 e investido US$ 100 mil em ações do
NYT, teria agora mais de U$ 900 mil.
Pouquíssimos papéis renderam
tanto. Para se visualizar melhor este resultado, basta dizer que as ações do
NYT aumentaram mais do que as da Renner, da Ambev e da Klabin, que cresceram
respectivamente 923%, 677% e 621% de 2010 a 2020. Se você comparar com fundos
de investimento, vai parecer jogo de amadores contra profissionais. O Icatu
rendeu 286%, o Paribas deu 257%, e o fundo do Banco do Brasil RFLP pagou 225%
sobre o capital dos seus investidores. Quem diria? Houve quem comparasse
jornais com carroças, que desapareceram depois da invenção do automóvel. Era um
engano.
E um negócio que todos davam
como terminal voltou a florescer. As pessoas confundiram os jornais com uma
indústria de papel. O papel era e segue sendo apenas uma plataforma para levar
informação ao consumidor. Hoje, todas as outras plataformas digitais alavancam
os veículos profissionais que produzem jornalismo profissional. E isso tem
enorme valor, como comprovam os números do NYT. Mais do que notícia e análise
em texto, os jornais produzem conteúdo em todos os formatos disponíveis, em
áudio, podcast e vídeo.
No Brasil e no exterior são os
jornais nos seus formatos digitais que pautam o resto da imprensa. Seus
produtos são os melhores do mercado. E agora oferecem conteúdos também para
entreter, além de informar. Uma coluna escrita por leitores do NYT chamada “Modern
Love”, que tem o objetivo exclusivo de entreter com curtas histórias de amor
escritas pelos seus leitores, em pouco tempo transformou-se num sucesso. No ano
passado, “Modern Love” virou uma série da Netflix.
Alguém pode dizer que o exemplo
do NYT não reflete a realidade da maioria por se tratar de um jornal mundial,
lido em praticamente todos os países. É verdade. Mas também é verdade que os
grandes jornalões brasileiros voltam aos poucos a ver seus índices crescer. A
carteira digital do GLOBO, segundo matéria publicada em janeiro, aumentou 154%
em três anos, e o jornal tem hoje mais de 330 mil assinantes que pagam para
consumir seu conteúdo. Em meados dos anos 2000, sem a ameaça da internet, o
objetivo do GLOBO era chegar a 500 mil assinaturas. Nada mal.
Há muito chão para percorrer,
mas não dá para negar que há boas notícias no ar para os jornais.
Fonte: O Globo
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