Os rumos do jornalismo e dos jornais
4 de dezembro de
2018
“O jornalismo e os jornais enfrentam a
tormenta com medidas que, pouco a pouco, vão desvendado resposta sobre como
superar as contradições e conflitos que constrangem e atingem as mais diversas
profissões e atividades”. Portal Comunique-se publica
artigo do professor Marcel J. Cheida
As grandes e
profundas transformações vividas nas últimas três décadas, com a acelerada
expansão das tecnologias da informação, afetam toda a sociedade, em todo o
planeta. O mundo da comunicação social virou de ponta cabeça. As novas gerações
digitais trafegam na construção de um universo centrado na conectividade, na
produção e consumo de informações rápidas, breves e superficiais, geralmente.
A palavra crise tem
sido constante empregada para qualificar tais mudanças que chegam a ser
radicais. E ela afeta todas as formas de comunicação, tanto a interpessoal, que
virou refém dos celulares, como a social, moldada pelas redes sociais, sites e
blogs.
Nesse universo, o
jornalismo e os jornais enfrentam a tormenta com medidas que, pouco a pouco,
vão desvendado resposta sobre como superar as contradições e conflitos que
constrangem e atingem as mais diversas profissões e atividades. Contudo, a
resiliência sobre as mudanças tecnológicas é inerente à capacidade humana em
inventar, criar e se adaptar para tirar o máximo que pode daquilo que domina.
“A palavra crise
tem sido constante empregada para qualificar tais mudanças que chegam a ser
radicais”
Assim, a questão
maior não é propriamente o impacto tecnológico sobre a sociedade e sim as
alterações comportamentais, culturais e as novas crenças que dele derivam e se
viralizam sem qualquer conexão com a factualidade. O imaginário enriquecido
pela polarização das ideias encontra nas redes o ambiente para se propagar e
desdizer o mundo. É a pós-verdade e a fraude noticiosa que empurram milhões a
crer em ilusórias mensagens como se fossem ideias absolutas. No subterrâneo das
redes, crackers e hackers alimentam informações diversas, artificiosas e
carregadas de intenções manipuladoras. Como combater essa poderosa munição informativa
que atinge de morte as verdades sobre os fatos?
O jornalismo é um
das importantes ferramentas de defesa contra as fraudes, o ilusório e as
mentiras que tomam conta do imaginário de tantos. O mal das informações
fraudulentas é que quem as toma como verdadeiras incorre em erros, falha em
projetos e sucumbe ao ridículo por não se sintonizar com a realidade cotidiana.
O modelo de
sociedade líquida proposto por Zygmunt Bauman ajuda a entender como as
informações se moldam ao interesse e ao sentimento de quem a produz ou a
consome, numa reação de brevidade impermeável à reflexão. Alguns estudos
recentes sobre o ecossistema digital apontam um caminho de regresso às
sociedades da era anterior à imprensa. As informações trafegam em fluxos de
modo efêmero, sem enraizamento algum. Apesar da sofisticada tecnologia digital,
o costume é nostálgico de um passado remoto. É exatamente a invenção da
imprensa de Gutenberg, no século XV, a expansão da impressão dos livros e a
criação dos periódicos que superam aquele estado permeado pela ignorância e
pelo misticismo para a Europa ingressar na Modernidade. E o jornalismo passou,
então, a se desenvolver para cumprir um papel essencial, mesmo com erros e
fragilidades de qualquer projeto humano.
“O jornalismo é um
das importantes ferramentas de defesa contra as fraudes”
Os jornais são
fundamentais para espantar a ignorância cotidiana que acomete legião de
indivíduos que pouco leem ou que desprezam a leitura. Nenhum país com alta
qualidade de vida conquistou tal status sem a leitura, sem livros, sem jornais.
Mesmos os erros e absurdos publicados em periódicos diversos são pouco frente
às notícias procedentes, elaboradas com esmero por milhares de profissionais. A
relação entre a leitura de jornais e o índice de qualidade de vida é decisiva
para entender como o jornalismo contribui para melhorar as condições sociais.
Os jornais ainda
detêm um bom nível de credibilidade entre os brasileiros. Mesmo quando
criticados, muitas vezes verifica-se a improcedência de acusações oriundas de quem
pouco conhece o processo noticioso.
Thomas Jefferson,
um dos pais da nação norte-americana, dizia que era preferível uma sociedade
sem governo do que sem jornais. A radicalidade da afirmação contempla um senso
crítico e em favor da imprensa e da notícia publicada como organismos
fundamentais numa sociedade política, democrática, de cidadãos livres. Mesmo
com a presença ostensiva das redes sociais no dia a dia de milhões de
brasileiros, os jornais se constituem em ilhas de esclarecimentos. É evidente que
também respeitados sites e blogs noticiosos contribuem para adensar o debate e
oferecer maior compreensão sobre fatos complexos para segmentos de sujeitos que
preferem a informação rasteira, breve, manchada pelo preconceito, pelo clichê.
“Os jornais são fundamentais
para espantar a ignorância cotidiana que acomete legião de indivíduos que pouco
leem ou que desprezam a leitura”
Jornalistas
formados são profissionais preparados para detectar nas nuvens aquilo que tem
relação com os fatos, de modo a filtrar e a eliminar a poluição de mensagens
improcedentes, produzidas por algoritmos cujos autores agem com más intenções.
Ler jornais, em qualquer plataforma, física ou virtual, implica em compromissos
com o noticiário que esculpe o cotidiano. Quem lê dispõe de recursos mais
rigorosos para enfrentar a trama conturbada de uma sociedade conflitiva.
Cada vez mais, os
jornais e o jornalismo são bases para contribuir com a ampliação do
conhecimento sobre os atos dos governantes e assim oferecer ao cidadão
condições para que possa cobrar, exigir e até mudar os rumos de um governo. As
informações breves, toscas e superficiais, ao contrário, servem a quem está
descompromissado com a cidadania, mesmo quando há um grave desprezo pelas
instituições governamentais. Seja na Europa, na América ou mesmo na Ásia, a
presença dos jornais é decisiva para medir o desenvolvimento e a riqueza de uma
sociedade. O Brasil precisa se empenhar mais para aperfeiçoar o jornalismo e
estender a produção e a leitura de jornais.
***** ***** ***** ***** *****
Por Marcel
J. Cheida. Jornalista e professor de jornalismo da Pontifícia Universidade
Católica de Campinas (PUC-Campinas).
Nenhum comentário:
Postar um comentário